11/05/2012
A presidente Dilma Rousseff já se decidiu quanto à escolha dos integrantes da Comissão da Verdade. A notoriedade e respeitabilidade dos nomes acalenta o entendimento de que a Comissão estará intelectual e ideologicamente afinada com uma espécie de lema anunciado pela presidente no discurso pronunciado a 18 de novembro de 2011, quando sancionou o projeto aprovado no Congresso: “Não quero revanchismo nem a cumplicidade do silêncio”. Há quem considere que foi demasiada a demora de sete meses para a indicação dos nomes. “A presidente”, dizem os que assim pensam, “perdeu o timing e com isso enfraqueceu as expectativas da sociedade em relação à Comissão ”.
Talvez. Mas devemos reconhecer o alto grau de dificuldade da tarefa de indicar os nomes de sete pessoas que, na Comissão, devem assumir o compromisso de investigar com rigor tudo o que a Nação tem direito de conhecer – e de fazê-lo com uma ideia de Justiça imune a tentações de revanchismo. Mas também sem medo das verdades a serem reveladas. Entretanto, nos debates mais acalorados em torno da Comissão da Verdade afloram, com vigor, os argumentos de dois lados extremos em divergência.
Já ouvi, em debates, empolgadas proclamações em favor de um ajuste de contas. É a voz do revanchismo, corrente para a qual a Lei da Anistia não pode significar perdão para crimes de tortura, sequestros, assassinatos e ocultação de corpos. A esses não basta o desvendamento rigoroso do que verdadeiramente aconteceu, para que o Brasil faça as pazes com a sua própria História. É o clamor revanchista de algumas das vítimas, ou de quem fala por elas, em defesa de uma ideia de Justiça sem reconciliação.
Em posição oposta estão, principalmente, os grupos militares e civis identificados com a violência das razões repressoras do regime militar ditatorial. Para esses, a Lei da Anistia é entendida e defendida como um abençoado cobertor de silêncio, sob o qual não há feridas abertas, apenas cicatrizes, que devem permanecer escondidas e esquecidas. Em ambos os lados há gente poderosa, que fala grosso e rejeita alternativas de diálogo. E que, por motivos opostos (cada lado com os seus), desconfia da Comissão da Verdade e a submete desde já a pressões discursivas com propostas de rumos e critérios que pouco têm a ver com a lucidez do lema-síntese definido por Dilma Rousseff: nem revanchismos nem a cumplicidade do silêncio. Em favor desse lema cresce uma terceira corrente, juridicamente mais sofisticada, defendendo o entendimento de que “a Comissão da Verdade é a garantia de um novo parâmetro de respeito à dignidade humana no Brasil e o caminho para uma justiça de transição” – sistema jurídico que permite julgar abusos não permitidos à época pelas próprias leis da ditadura (tortura e assassinatos, por exemplo), crimes que podem até estar prescritos, mas em relação aos quais é preciso construir aquilo a que os especialistas chamam “jurisprudência histórica de responsabilização”, com a qual se possa verdadeiramente instalar um processo de transição democrática assentada sobre a verdade, a memória e a reparação.
Essa é a opinião do advogado e professor de direito internacional Marcos Guerra, ex-preso político da ditadura militar, membro da Comissão de Justiça e Paz da CNBB e que hoje, no espaço da OAB-RN, se dedica prioritariamente ao estudo e à defesa dos direitos humanos. É dele a argumentação mais consistente que conheço sobre o que deve ser e o que da Comissão da Verdade devemos esperar.
Leia íntegra do artigo:
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