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  Fórum Social Mundial: Novos rumos na luta pela democratização da comunicação?

  31/01/2005

Quando a organização do Fórum Social Mundial abriu uma consulta pública para a definição de seus espaços temáticos para o evento de 2005 em Porto Alegre, "comunicação" foi eleita como um de seus 11 eixos, integrando a programação com o título  "ESPAÇO D - Comunicação: práticas contra-hegemônicas, direitos e alternativas".  Nesse espaço, foram diversas atividades, seminários e debates ao longo do FSM (26 até 31 de janeiro). Veja, abaixo, duas análises do professor e pesquisador Venício Lima acerca do tema.* 


Novos rumos na luta pela democratização da comunicação?

Muitas vezes não é fácil antever as implicações concretas que a substituição de um paradigma discursivo por outro ou uma mudança conceitual podem provocar. Thomas Kuhn, em seu livro clássico sobre a estrutura das “revoluções” científicas, argumenta que o avanço científico ocorre dessa forma. E, muitas vezes, é também assim que pode avançar – ou retroceder – a disputa política pela hegemonia em determinado campo da atividade humana. 

O principal paradigma conceitual que tem orientado boa parte dos segmentos organizados da sociedade civil comprometidos com o avanço na área de comunicação, não só no Brasil, tem sido a idéia força da sua
democratização. A democratização da comunicação tem sido uma bandeira consensual. Todavia, uma das falácias dessa construção discursiva é que ela indica a possibilidade de que a grande mídia hegemônica, privada e
comercial, seria passível de ser democratizada. Isso equivale a acreditar que os grandes conglomerados de mídia abririam espaço para a  pluralidade e a diversidade de vozes de nossa sociedade. Recentemente Bernard Cassen
considerou essa “crença” uma ilusão fundamental, não só da esquerda, mas, sobretudo, daqueles que trabalham na perspectiva de que “um outro mundo é possível”.

Pois bem. As construções discursivas não surgem independentemente das circunstâncias históricas nas quais elas são geradas. E é por isso que a nova tentativa de “re-enquadrar” a luta pela democratização na perspectiva
de que o direito à comunicação é um direito humano fundamental e se expressa, sobretudo, através da criação de um sistema público de comunicação igualmente independente do estado e da iniciativa privada, pode mudar os rumos de como essa luta tem sido conduzida até agora.

É isso que entidades como a CRIS, seu capitulo brasileiro, a CRIS-Brasil, e o Intervozes estão tentando fazer. E foram os debates promovidos por essas entidades que predominaram no terceiro dia do 5º FSM no espaço
temático “Comunicação: práticas contra-hegemônicas, direitos e alternativas”.

A proposta conceitual de um direito à comunicação não é coisa nova. Sua primeira formulação já tem mais de 30 anos. Também não é novo que entidades e movimentos sociais que lutam pela democratização da
comunicação no Brasil inscrevam esse direito – direta ou indiretamente – entre os eixos principais de seus programas de ação. O novo é a retomada do conceito, apoiada numa articulação internacional, como foco
principal da organização de movimentos e de propostas de ação e, além disso, vinculada à discussão concreta de um sistema público de comunicação.

É essa a proposta do coletivo Intervozes. É verdade que os obstáculos para sua articulação são inúmeros. Em primeiro lugar, o direito à comunicação não logrou ainda o status de direito positivado. Isso ainda não aconteceu
nem mesmo em nível dos organismos multilaterais que têm a capacidade de provocar o reconhecimento internacional do conceito, como, por exemplo, a UNESCO. Esse fato faz com que, simultaneamente à articulação política de ações específicas, desenvolva-se também a luta pelo reconhecimento formal do direito. Em segundo lugar, há históricas e poderosas resistências ao conceito, exatamente pelo poder que ele teria de abarcar, sob suas
asas, um imenso leque de reivindicações e bandeiras em relação à democratização da comunicação. Mas, aparentemente, as entidades que promovem os debates estão conscientes dessas – e de outras – dificuldades, mas estão dispostas a ir em frente.

O dia foi também marcado por outros eventos relevantes. Menciono alguns. A distribuição, em diferentes atividades, de um dossiê assinado por  dezenas de entidades, intitulado “Querem calar a voz do povo, 2” que descreve
em detalhes a ação coordenada da ANATEL e da Polícia Federal contra centenas de rádios comunitárias em todo o país. Essa é sabidamente uma área crítica que está a exigir pronta ação do governo federal. Do jeito que está,
não dá para continuar. O anúncio pela campanha “Quem financia a baixaria é contra a cidadania” da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados do primeiro ranking dos piores programas de televisão do país,
em 2005. A novidade é que, junto ao nome dos programas, foram também divulgados – pela primeira vez - os nomes dos seus patrocinadores anunciantes. E finalmente, um debate promovido pelo FNDC, pela UCBC e pelo Conselho Federal de Psicologia, discutiu diversas experiências de educação para a mídia, ponto fundamental para uma cidadania informada e com capacidade crítica em relação à mídia.

Como se vê, foi mais um dia movimentado. São muitas os diagnósticos e muitas as propostas. Algumas realmente novas e promissoras. Não é exatamente isso que se espera do 5º FSM?


Fragmentação e diversidade

No último dia de atividades programadas no FSM 2005, o espaço temático da “Comunicação: práticas contra-hegemônicas, direitos e alternativas”  foi marcado pela fragmentação e pela diversidade. A grande maioria das 21
atividades previstas foi desenvolvida por entidades que são pouco conhecidas além de sua própria área geográfica de atuação. E os temas das atividades oscilaram entre o muito específico e o excessivamente geral.

Quais são essas entidades e quais foram os temas discutidos? Alguns exemplos: a ALICE, Agência Livre para Infância Cidadania e Educação discutiu “Comunicação Alternativa e movimentos sociais”; a Design
Action, “Designs on democracy: communication for liberation”; o Fórum Intermunicipal de Cultura, “Cultura de Paz na Mídia: é possível?”; a Frente de Comunicação de Porto Alegre, o “Monopólio e oligopólio das comunicações”; a Fundação Artemísia, “Mão na Mídia: o jovem e a comunicação”; o IMPA-GT de Buenos Aires, promoveu a exibição do
VideoBardo; a Liga Brasileira de Esperanto, “O papel do Esperanto como mediador de igualdade lingüística”; o Movimiento Barrios de Pie da Argentina, “Médios de comunicación alternativos, populares y gubernamentales em la nueva etapa de latinoamerica”; o Programa Social Gotas de Flor com Amor, “Comunicação-Jovens transformando sua comunidade”; e a Revista Digital Art, a oficina “Como organizar e gerir uma publicação digital: nosso caminho”.

Existe algum fio condutor comum dentro dessa incrível fragmentação e diversidade? Creio que sim. Primeiro, é inegável a existência de um sem-número de iniciativas concretas que tentam não só possibilitar um novo olhar crítico da mídia como, sobretudo, a construção obstinada de espaços alternativos de mídia popular nas comunidades locais. Segundo, o crescimento desse tipo de iniciativas é a expressão de um descontentamento
generalizado em relação à mídia hegemônica.

É interessante observar que isso vem acontecendo apesar da grande mídia raramente pautar a si mesma. Os temas a ela relacionados quase nunca fazem parte de sua agenda. A exceção ocorre quando iniciativas identificadas como possíveis ameaças ao seu status quo surgem e, então, a grande mídia vê-se obrigada a pautar o tema para combatê-lo. Foi o que aconteceu entre nós com as propostas de criação, primeiro do Conselho Federal de Jornalismo (depois de Jornalistas) e depois de transformação da ANCINE em ANCINAV, em 2004. Essas iniciativas forçaram o agendamento da questão da mídia, mesmo que sob um enquadramento deliberadamente negativo.

De qualquer maneira o que parece claro – e que o FSM2005 confirma – é que existe sim um crescente movimento de resistência, ainda que quase anônimo, exatamente porque raramente ocupa espaço na mídia dominante. E mesmo quando inserido em eventos da expressão de um FSM, como agora em Porto Alegre. Apesar disso, o movimento espalha-se pelas mais diferentes regiões do planeta e dá fortes sinais de que se consolida, sobretudo, entre as novas gerações.

Não é exatamente assim que os movimentos que transformam o mundo começam?

* As análises foram realizadas para a Agência Carta Maior: www.agenciacartamaior.uol.com.br  

 
 
 
   
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