17/03/2004
Na capital paulista vivem
atualmente 150 mil bolivianos, 40 mil paraguaios, 40 mil chilenos, 15 mil
peruanos e milhares de outros latinos que vieram para a cidade grande em busca
de melhores condições de vida. Como a imensa maioria deles é clandestina, ou
seja, não tem autorização para residir no Brasil, a prefeitura de São Paulo até
hoje não conseguiu estabelecer um canal de comunicação eficiente com esta
população. Ao mesmo tempo, as entidades de bairro e organizações
não-governamentais que desenvolvem trabalhos de assistência aos latinos são
categóricas ao afirmar que todos se reúnem ao redor da Latina Sat, uma rádio
comunitária que diariamente coloca no ar uma programação voltada para este
público.
O problema é que, assim como as demais emissoras
comunitárias, a Latina Sat corre o risco de ser fechada pela Anatel (Agência
Nacional de Telecomunicações). Somente este ano, a agência apreendeu R$ 7
milhões em equipamentos, e a lista de emissoras que esperam por uma autorização
para funcionar tem mais de 200 nomes.
No dia 5 de novembro do ano passado, em reunião
convocada pela Comissão de Administração Pública da Câmara Municipal, o gerente
geral de Planejamento e Regulação da Anatel, Yapir Marotta, assegurou que no
início do segundo semestre de 2004 as emissoras comunitárias passariam a dispor
de um canal específico para operar. Este canal abrigaria diversas rádios na
mesma frequência, de acordo com a região da cidade, e legalizaria sua atuação.
Mas a espera dura anos.
Num debate realizado neste sábado (13), também na
Câmara Municipal de São Paulo, a Anatel alegou que ainda aguarda o resultado de
um estudo do CPqD (Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações)
para decidir a frequência a ser concedida. "Estamos aguardando uma resposta do
CPqD sobre essa questão do dial. Todas as solicitações de outorgas estão sendo
apreciadas", garantiu Arnaldo de Souza Filho, assessor da
Anatel-SP.
O debate na Câmara, que reuniu mais de 200
representantes de 80 entidades, tinha o objetivo de discutir a importância das
rádios comunitárias na implementação das políticas públicas de saúde do
município. Vereadores, comunicadores e agentes de saúde acreditam que o trabalho
feito dentro do Programa de Saúde da Família pode ser potencializado com a ajuda
das emissoras locais, melhorando a qualidade de vida da população.
"A expansão das rádios comunitárias é muito
importante para suprir parte da demanda de veicular a mensagem da saúde.
Enquanto a grande mídia é muito cara para isso, as rádios são um instrumento
barato e democrático", aponta Gonzalo Vecina, Secretário Municipal da Saúde. "No
caso da Latina Sat, o rádio serviria para ajudar a combater a tuberculose, que é
um grande problema para esta população. Se as pessoas pudessem ouvir as
emissoras comunitárias, teriam condição de mudar seus hábitos.",
afirma.
Para o vereador Carlos Neder (PT), que propôs a
organização do seminário, não é possível construir uma política de saúde
dissociada de uma política de fortalecimento do poder local. "Esta aqui não é
uma discussão comercial. Doenças poderiam ser melhor combatidas pelo
esclarecimento da população através de canais ágeis de comunicação. Por isso,
fazemos um pedido: que a Anatel e o Ministério das Comunicações estejam atentos
à necessidade de inovar nas formas de mobilização e exercício da democracia",
apontou Neder.
Plano Diretor
Para definir com mais precisão quantas emissoras de
rádio podem operar no município de São Paulo, a cidade não precisa apenas do
resultado dos estudos do CPqD, que deve ser divulgado pela Anatel. É necessário
fazer um planejamento físico do território, levando em conta a topografia
regional, para evitar, por exemplo, que as próprias rádios comunitárias
interfiram umas nas outras. Este planejamento, proposto pelo vereador Nabil
Bonduki (PT), ganhou o nome de Plano Diretor da Radiodifusão Comunitária, e deve
ser feito nos moldes do Plano Diretor atualmente em elaboração na Câmara.
"Assim, poderemos fazer da rádio comunitária um meio importante de informação,
cultura, educação e sociabilidade, garantindo a democracia", disse
Bonduki.
O primeiro passo para a elaboração do Plano Diretor
da Radiodifusão Comunitária foi dado já durante o seminário deste sábado. Sob a
coordenação da Oboré Projetos Especiais em Comunicações e Artes, os mapas das 31
Subprefeituras de São Paulo foram assinalados com a área de cobertura do
Programa de Saúde da Família, com a localização de diversas Unidades Básicas de
Saúde e com todas as escolas municipais que já passaram pelo Educom.rádio, um
projeto que desenvolve atividades de comunicação relacionadas à radiodifusão
comunitária, ensinando os alunos a operar uma rádio.
"Os mapas vão nos ajudar a descobrir quais os
equipamentos de saúde, educação e comunicação existentes em cada área. A relação
entre eles dará os primeiros elementos para a Câmara Municipal elaborar o Plano
Diretor de Radiodifusão Comunitária da capital", explica o jornalista Sérgio
Gomes, da Oboré. Ele acredita que, dando prioridade para a regulamentação e
instalação de rádios nas áreas já cobertas pelo Programa de Saúde da Família, os
agentes de saúde ajudarão a divulgar a programação da rádio e a população se
beneficiará com as informações veiculadas.
Depois de pronto, o Plano Diretor de Radiodifusão
pode ajudar a trazer de volta ao ar rádios como a Everest, na Zona Leste, cujo
programa de saúde foi premiado na Espanha, mas que hoje continua lacrada pela
Anatel.
Os participantes do seminário devem agora
encaminhar um abaixo-assinado para o Ministério das Comunicações cobrando
medidas urgentes para a instalação do canal comunitário em São Paulo. Eles
também pedirão à prefeitura que realize uma Conferência Municipal de Comunicação
e Saúde, nos moldes da conferência nacional que está prevista para o ano que
vem.
Para saber mais sobre projetos desenvolvidos na
área de saúde pelas rádios comunitárias, visite o site www.obore.com A Oboré também oferece
assessoria jurídica para quem quiser montar uma emissora comunitária ou tiver
tido seu equipamento apreendido. |