10/11/2002
Jean-François Olivier, chefe da
Delegação do CICV (Comitê Internacional da Cruz Vermelha) no Brasil abriu na
manhã de ontem a série de palestras/entrevistas coletivas do II Curso de
Informação Sobre Jornalismo em Situações de Conflito Armado, promovido pelo CICV
e pela OBORÉ Projetos Especiais, como mais um módulo do Projeto Repórter do
Futuro.
A criação e as atribuições do CICV em contextos de conflitos
armados e em contextos de paz foram os temas desta primeira palestra/entrevista
coletiva. Os estudantes também mostraram grande curiosidade sobre o
posicionamento do CICV no jogo de forças entre as potências mundiais ao longo da
história e, principalmente, sobre a política norte americana na “guerra contra o
terror”, implementada depois de 11 de setembro.
A violência nas capitais
brasileiras e os últimos episódios noticiados sobre a situação da segurança
pública no Rio de Janeiro, também foram tema de perguntas. Os estudantes queriam
saber porque não se declara que a capital fluminense vive uma guerra
civil.
Ernesto Paglia, jornalista da TV Globo, que faria sua exposição na
sequência, fez perguntas sobre eventuais falhas históricas na atuação do Comitê,
como a Segunda Guerra Mundial, e quis saber como a entidade concilia os
princípios de neutralidade, imparcialidade e independência com o uso de um
emblema que pode ser visto como referência a cruz das religiões cristãs.
Olivier lembrou que a presença massiva do CICV no mundo é um fato
recente. Em episódios como a Segunda Guerra, o Comitê contava com menos de 150
pessoas. Hoje são 600 funcionários só na sede, em Genebra, e outros 12,5 mil
espalhados pelo mundo todo. Sobre o emblema, Olivier explicou que trata-se,
antes de mais nada, de um sinal identificável à distância, além de ser uma
homenagem à bandeira suíça, onde foi criado o movimento. Para locais de cultura
muçulmana, a entidade também é reconhecida pelo Crescente Vermelho.
Para
parte dos presentes a primeira surpresa foi entender que o CICV não foi criado
como uma ONG (Organização Não Governamental), nem como uma organização com fins
pacifistas. O Comitê também não atua através de denúncias públicas sobre
violações de Direitos Humanos e do Direito Internacional Humanitário, salvo em
condições consideradas extremas e reiteradas.
“A guerra é parte da
história da humanidade e deve continuar fazendo parte da história até o fim da
humanidade”, disse Olivier. “O trabalho deste Organismo Internacional chamado
CICV é em favor das vítimas dessas guerras, sem fazer distinções entre o bem ou
o mal, deus ou o diabo. Para cumprir com isso, não podemos discutir qual das
partes tem razão”.
O chefe da delegação brasileira explicou que as
situações de violência nos grandes centros, à exemplo do Rio de Janeiro, não são
consideradas guerras civis. Apesar de reconhecer que o tema é controverso,
Olivier explicou que a legislação internacional trabalha com critérios como
“persistência do conflito no tempo, comando definido e propósitos como anexação
ou emancipação de território, auto-determinação de um povo ou formação de um
governo paralelo”, o que não se configura completamente do caso brasileiro.
O chefe da delegação reconheceu a gravidade da situação, mas lembrou que
o Brasil tem um governo constituído, tem suas forças policiais formadas, seu
sistema judiciário em funcionamento e, portanto, todas as condições de fazer
frente aos casos de violência. Ele ressaltou que “a colaboração do CICV se dá
atravé de um grande projeto construído em parceria com o Ministério da Justiça,
de formação de capacitadores que trabalham com a questão dos Direitos Humanos
dentro das Forças Policias, nos Estados”.
O trabalho com as polícias
militares é uma das atribuições do CICV em contextos de paz, como é o caso do
Brasil. Além deste projeto, Olivier explicou que o CICV também realiza
permanentemente cursos de formação em Direito Internacional Humanitário com as
Forças Armadas Brasileiras, além de parte da preparação das tropas que compõem
as Forças de Paz da ONU (Organização das Nações Unidas), como no caso da
presença de tropas brasileiras no Timor Leste.
O representante da
Delegação do CICV no Brasil considerou o encontro uma oportunidade importante
para os futuros jornalistas saberem mais sobre os temas internacionais, o
trabalho do CICV, as questões legislativas do Direito Internacional Humanitário
e dos Direitos Humanos, além de passarem a contar com a instituição como uma
fonte preciosa e imparcial de informação para temas humanitários. |