07/04/2014
Na quinta palestra/conferência de imprensa do 7º Curso Descobrir São Paulo - Descobrir-se Repórter, o cientista político Marco Aurélio Nogueira debateu com os estudantes o tema Participação Cidadã. As manifestações de junho de 2013, que colocaram na agenda política do país o debate público sobre as insuficiências da democracia representativa, abriram a fala de Nogueira. Segundo avalia, a participação de centenas milhares de pessoas de manifestantes não organizados nas ruas representou uma explosão coletiva de angústia.
Marco Aurélio acredita que essa angústia reflete o ritmo de vida das pessoas. "O celular traduz o estilo de vida atual. Estamos conectados o tempo todo. Por meio dele nos informamos sobre o que acontece em todos os níveis, desde o plano pessoal ao social. Isso cria, ao mesmo tempo, cidadãos informados como em nenhuma outra época e uma grande ansiedade de visibilidade. O Facebook se tornou o paradigma de nossa visibilidade na sociedade. Hoje, o desejo de protagonismo individual exerce uma pressão violenta sobre todos. E esse padrão exposição é entendido como uma forma de cidadania", disse.
Bacharel em Ciências Políticas e Sociais pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo (1972) e doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo (1983) com pós-doutorado na Universidade de Roma, Itália (1984-1985) e livre-docente e professor titular pela Universidade Estadual Paulista (Unesp), Marco Aurélio Nogueira é professor colaborador do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Federal de São Carlos-Ufscar e colunista do jornal O Estado de S Paulo. Tem experiência na área de Ciência Política e de Gestão Pública, trabalhando principalmente com os temas: teoria política, reforma do Estado, democracia, sociedade civil, globalização, modernidade e integração latino-americana. Atualmente é professor titular da UNESP, professor do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais San Tiago Dantas (Unesp/PUC-SP/Unicamp) e diretor do Instituto de Políticas Públicas e Relações Internacionais-IPPRI da Unesp.
Para o cientista político, a ocorrência dos rolezinhos em 2014 está diretamente ligada às manifestações de junho. "Numa sociedade em que padrão de consumo é porta de entrada para a aceitação social, consumidor e cidadão se confundem. Se o shopping center é o templo dos sonhos, esse é o lugar a que os jovens querem ter acesso."
O imediatismo é outra característica comportamental que passou a exercer influência na postura política. "Em um tempo em que a velocidade da transmissão de informação e de acesso aos acontecimentos do mundo inteiro criam uma sensação de que tudo é frenético, a juventude não tem paciência para esperar por soluções de longo prazo. Quer soluções instantâneas", afirmou.
Nogueira acredita que esses dois fatores ajudam a entender porque as formas de organização política tradicionais foram atropeladas pelo vigor das manifestações. "Nem os partidos, nem os sindicatos, nem as organizações sociais conseguiram prever – e muito menos liderar – os protestos."
O que começou com demonstrações na rua contra o aumento das tarifas dos transportes – ônibus e metrô –, ganhou outro rumo depois da repressão violenta da polícia militar contra os manifestantes e, em particular, contra os jornalistas e fotógrafos que cobriam os protestos. "A resposta à violência policial, como afirmação da democracia e do direito de manifestação, ampliou a agenda das manifestações. Rapidamente, se escutaram palavras de ordem protestando contra tudo e contra todos. Mas o recado mais claro foi dado aos poderes Executivo, Legislativo e organizações sociais: "não nos representam" virou um mantra repetido nas ruas".
Regulação da mídia
Para Marco Aurélio, o caráter espontâneo das manifestações – convocadas essencialmente por meio das redes sociais dos indivíduos e não de organizações – determinou também o seu esvaziamento. "Os meios de comunicação amplificaram a voz das ruas e alimentaram os protestos. Mas a falta de uma agenda concreta de reivindicações e de interlocutores para participar de negociações fez o movimento refluir."
Nogueira comentou, ainda, a postura violenta de muitos manifestantes. "Não falo especificamente dos black blocs, que constituem uma proposta estética de recusa ao status quo e aos símbolos do poder. Mas é inegável que o uso de máscaras por manifestantes em um país como o Brasil, em que se lutou tanto pelo direito de mostrar o rosto, lança dúvidas sobre a adequação dessa estratégia. Ainda mais porque a não identificação do manifestante facilita a infiltração de provocadores interessados em promover a desordem como forma de justifica a repressão."
Autor do livro As ruas e a democracia, lançado no fim de 2013, Marco Aurélio Nogueira acredita que as manifestações de junho lançaram um desafio aos poderes constituídos, aos partidos e aos represnetantes da sociedade civil. "A sociedade brasileira, ao contrário do muitos acreditavam, não é passiva. Ela se movimenta e marca homem a homem os políticos. E gira em torno da mídia, entendida não somente como a mídia tradicional e sim o conjunto de manifestações que se expressam utilizando as ferramentas de comunicação modernas – em especial as redes sociais. Por isso mesmo a disputa em torno da regulação da mídia é um tema que enfrenta tantas resistências. Mas o Brasil precisa enfrentar esse debate se quiser fortalecer e aprofundar a nossa democracia."
Entrevista com Marco Aurelio Nogueira sobre o livro As Ruas e a democracia, Fundação Astrojildo Pereira.
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Assista, no vídeo abaixo, a reportagem sobre a Roda de Conversa "Reportagem nas manifestações de São Paulo", realizada no Centro de Imprensa/Redação-Escola da OBORÉ em 2 de julho de 2013 e coordenada pelo jornalista João Paulo Charleaux, da ONG Conectas e coordenador do módulo Jornalismo em Situações de Conflito Armado e Outras Situações de Violência, do Projeto Repórter do Futuro – realizado em parceria pela Conectas, OBORÉ Projetos Especiais e Abraji - Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo.
Assista a íntegra da Roda de Conversa, clicando aqui.
Ouça o áudio da íntegra da Roda de Conversa, clicando aqui.
Sobre o curso
O curso, de complementacão universitária em jornalismo e gratuito, é realizado em parceria pela Escola do Parlamento da Câmara Municipal de São Paulo, OBORÉ Projetos Especiais e Abraji – Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo. Conta com o apoio do SINPRO/SP – Sindicato dos Professores de São Paulo, Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo, Cátedra UNESCO de Comunicação, Hospital Premier/MAIS – Modelo de Atenção Integral à Saúde, NH Photos/Nivaldo Silva, IPFD – Instituto de Pesquisa, Formação e Difusão em Políticas Públicas e Sociais, e da coordenação dos principais cursos de Jornalismo de São Paulo, além das revistas Samuel, Brasil Atual, Caros Amigos, Fórum, Imprensa, Le Monde Diplomatique Brasil, Piauí e do blog O Xis da Questão – Mídia, Jornalismo e Atualidade, do Prof. Manuel Carlos Chaparro. |