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23/12/2008
Pilhas de papéis, documentos, fotografias, jornais, boletins e revistas do movimento sindical brasileiro e da OBORÉ Editorial ficavam arquivados em uma sala. O material era parte do acervo da Hemeroteca Sindical Brasileira – entidade criada em 1991, durante o 1º Encontro Paulista dos Profissionais da Comunicação Sindical, com o objetivo de reunir materiais informativos dos departamentos de imprensa das entidades sindicais, intersindicais e associações de classe de trabalhadores do Brasil, além de contribuir para a sua preservação.
Ali, estavam guardados 20 anos de história do movimento sindical, contada pela sua imprensa desde os anos duros da ditadura militar até o início da redemocratização do país. Era o retrato da história do trabalhador nesses anos em mais de dois mil títulos de periódicos e 16 mil documentos iconográficos, entre fotografias, provas contato e negativos.
A necessidade de organizar, catalogar, preservar e disponibilizar esse acervo ao público levou com que as publicações fossem incorporadas aos arquivos e coleções do Arquivo Histórico do Movimento Operário Brasileiro (ASMOB), de propriedade do Instituto Astrojildo Pereira (IAP). Todo esse material está sob guarda do Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual Paulista (CEDEM/UNESP) desde fevereiro de 2005.
Mas foi em meados de 2007, que este material depositado CEDEM/UNESP começou a ser trabalhado. À época, um grupo de aproximadamente 20 estudantes começou a separar o material para o início da organização e limpeza do acervo. O trabalho durou o período das férias e gerou a primeira triagem do material. Atualmente, menos de 10 pessoas trabalham nesse material. “Isso porque dependemos de recursos externos para organizar todo o acervo”, explica uma das responsáveis pela coordenação do acervo da Hemeroteca/OBORÉ Editorial Jacy Barletta.
Atualmente, dois projetos garantem que parte do acervo depositado seja trabalhado. Um projeto de pesquisa, financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), garantirá que uma pequena parte do material impresso e fotográfico da Hemeroteca seja devidamente conservado e catalogado; e um financiamento do Ministério da Cultura da Espanha vai garantir que até fevereiro de 2009, todo o acervo fotográfico da OBORÉ Editorial seja organizado. “É muito difícil conseguirmos aprovar projetos para organização de arquivos. Por isso, vamos fazendo tudo por partes. Até que tenhamos todo o acervo devidamente organizado e pronto para consulta”, conta Célia Reis Camargo, coordenadora do CEDEM.
Segundo Célia Reis Camargo, a expectativa é que o CEDEM seja contemplado pelo projeto governamental Memórias Reveladas, que pretende reunir informações em todo o país sobre o período militar (1964-1985). “Saindo isso, todo o acervo será trabalhado, pois o material cedido pela Hemeroteca e OBORÉ Editorial retrata exatamente esse período. Dessa forma, até 2010 todo o acervo já estará disponível para consulta”, diz.
Para a coordenadora do Centro de Documentação e Memória da UNESP, trabalhar e disponibilizar esse material é de extrema importância. “Não só pelo estudo do período da ditadura, como também no caso do material da editora OBORÉ, para o estudo da história da imprensa no Brasil. Eles tinham um projeto para atingir o sindicalizado pelo jornal que muda completamente a forma de abordagem. O que a OBORÉ propunha era uma nova maneira de se fazer jornalismo sindical. Eles faziam pesquisas profundas, milhões de reflexões para ver como as matérias deveriam sair. Se um pedacinho por dia, se mais charge, o tamanho de letra. Era um projeto muito elaborado. Então, não é só a história do Brasil no sentido da organização do trabalhador e do movimento sindical. É importante para a história do jornalismo, para a história da imprensa. É um acervo fundamental por isso”, afirma Célia Reis Camargo.
O CEDEM abriga ainda arquivos como o do fundador do Partido Comunista Brasileiro (PCB), Astrojildo Pereira, Oscar Niemeyer, Jorge Amado e Luis Carlos Prestes entre outras personalidades. A história dos movimentos sociais e políticos contemporâneos também estão lá, como os arquivos do MST e da administração de Luiza Erundina, prefeita da cidade de São Paulo entre 1989 e1992.
Em 2005, na mesma época em que se realizou o depósito do arquivo no Cedem, o historiador José Luiz Del Roio, ressaltou que os arquivos da Hemeroteca complementam um período do qual o ASMOB não tinha registros - de 1978 a 1989. Del Roio explicou que o acervo do movimento operário brasileiro vai do final do Século XIX - com os materiais anarquistas, o nascimento dos sindicatos e dos partidos políticos - e segue até o golpe de 1964 e que a parte mais rica é exatamente a resistência clandestina ao golpe militar de 1964 e até 1979, quando acabava a clandestinidade.
Del Roio contou que houve então, uma decisão da direção da ASMOB que o acervo se encerrava ali, cumpria seu papel de arquivo e entrava num outro momento histórico. "A Hemeroteca, e aí está a coincidência absurda, vai tratar exatamente da origem, de como das trevas sai para a luz, ainda não é legal, mas já não é clandestino, não há mais repressão. Nós não temos a parte referente ao desenvolvimento democrático de 78 a 89, que é um dos mais extraordinários movimentos da história do Brasil, que teve a sua grande conquista na Constituição de 1988. Esse período complementa totalmente os arquivos que já temos. Isso é o que de mais rico proporcionam os arquivos da Hemeroteca", enfatizou à época Del Roio.
Apesar de ainda estar em fase de organização e por isso ainda fechado à consulta pública, o acervo já está gerando conhecimento. Alguns pesquisadores, que também trabalham na organização do material, já estão utilizando parte dos documentos para suas análises em projetos de doutorado. A expectativa é que parte desse material já esteja aberto à consulta em meados de 2009.
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