Daniela Alarcon - Observatório do Direito à Comunicação
08.10.2007
Se a implantação do rádio digital alimentava expectativas quanto ao aumento do número de emissoras, melhorias na qualidade do som e o fim das interferências na transmissão das emissoras AM, a escolha do padrão pode resultar no inverso.
Segundo especialistas, a implantação do sistema HD Rádio (também conhecido como Iboc) pode provocar o desaparecimento de um terço das emissoras de São Paulo: deixariam de funcionar 13 das 39 emissoras comerciais em atividade na cidade, entre as locais e as que têm área de cobertura na região metropolitana. Isso porque, para que comece a transmitir simultaneamente os sinais analógico e digital, cada emissora vai dobrar de espaço: dos atuais 200 kHz, passará a 400, diminuindo as possibilidades de ocupação do espectro em aproximadamente 30%.
“Com o HD Rádio, algumas emissoras comerciais serão prejudicadas, pois deixarão de existir, e outras, beneficiadas pela redução de concorrência. Mas qual será o critério para decidir quem fica e quem sai?”, pergunta o engenheiro e pesquisador Marcus Manhães.
No afã de realizar rapidamente a transição, o Ministério das Comunicações prescindiu de levantamentos sobre as implicações econômicas, políticas e sociais da escolha [veja matéria]. Claramente favorável ao sistema norte-americano, o órgão sequer realizou testes comparativos entre os padrões, e faz ouvidos moucos às críticas que o HD Rádio vem sofrendo de engenheiros, dirigentes de emissoras públicas e representantes de rádios comunitárias.
Falso IBOC
Dois padrões são compatíveis com o sistema de radiodifusão brasileiro: o HD Rádio, desenvolvido pela empresa norte-americana iBiquity Digital Corporation (que apresenta os sistemas AM IBOC e FM Iboc) e o Digital Radio Mondiale (DRM), desenvolvido por um consórcio europeu.
Os radiodifusores e o ministro Hélio Costa apresentam o sistema norte-americano como o mais adequado à realidade brasileira. Sua justificativa é o fato – imprescindível, segundo eles – de o Iboc manter as emissoras em suas freqüências atuais.
O conceito de Iboc (In Band on Channel) é transmitir sinais analógico e digital em um mesmo canal. O sistema norte-americano, contudo, não é um Iboc de fato. Em vez de manter os dois sinais no espaço ocupado pela emissora originalmente, de 200 kHz, o sinal digital é alocado nas laterais, avançando sobre outras emissoras.
“O sistema da iBiquity”, observa o engenheiro Takashi Tome, “parte do pressuposto de que o espectro está esparsamente ocupado e que os canais adjacentes estão livres”. Nas regiões metropolitanas brasileiras, onde o espectro é congestionado, esse procedimento pode causar interferências e, na prática, suprimir emissoras.
Não há qualquer garantia de que quando o sinal analógico seja suprimido a emissora voltará ao seu tamanho anterior. A própria iBiquity já propôs a ampliação das emissoras, após a implantação do rádio digital, para 250 kHz, sob justificativa de melhorar a recepção.
Atualmente, está em desenvolvimento um DRM em modo Iboc. Com uma diferença fundamental do modelo da iBiquity: “o sinal fica estritamente confinado ao próprio canal (ou seja, é um Iboc verdadeiro) e, assim, não interfere nas emissoras adjacentes”, diz Tome.
Pressa
A Universidade de Brasília, em parceria com a Radiobrás, anunciou que irá testar o DRM – até agora, apenas o HD Rádio foi testado no Brasil. Segundo Lúcio Martins da Silva, professor do Departamento de Engenharia Elétrica da UnB, é inviável escolher o padrão agora. “A menos que não se espere pelos testes”, conclui.
A Anatel, por meio de sua assessoria de imprensa, informou que aguarda a finalização dos trabalhos na UnB para realizar a avaliação com o padrão DRM. A agência enfatiza, porém, que sua função é subsidiar as decisões do Ministério das Comunicações, que é o responsável pela decisão sobre os padrões e sobre o cronograma de implantação do rádio digital no país.
O ministro Hélio Costa declarou à imprensa, em diferentes ocasiões, que a decisão tem de ser tomada com urgência e que não é possível esperar pelos resultados de testes com o DRM. Procurado pela reportagem, o Ministério das Comunicações afirmou que todas as informações sobre o rádio digital estão disponíveis em seu site na internet.
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