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  Ministério acena com habilitação para emissoras em São Paulo
Antonio Biondi – Carta Maior
  24/11/2006

Após oito longos anos de espera, o Ministério das Comunicações deve publicar, no próximo dia 4 de dezembro, um inédito aviso de habilitação para rádios comunitárias no município de São Paulo. O aviso é o primeiro passo para que as rádios existentes na cidade possam ser regularizadas. Desde a aprovação da lei que regulamenta os serviços de radiodifusão comunitária no Brasil (9.612/98), a capital paulista nunca havia sido contemplada por um aviso de habilitação, ao contrário da grande maioria das demais capitais e regiões do país.

A intenção do Ministério em publicar o aviso de habilitação no dia 4 do próximo mês foi afirmada em reunião na Câmara Municipal envolvendo alguns dos principais segmentos dos governos municipal, estadual e federal e da sociedade civil ligados ao assunto. A assessoria de imprensa do Ministério confirmou à reportagem da Carta Maior nesta quarta-feira (22) que a expectativa para a publicação do aviso segue apontando para esta data.

No entanto, na mesma semana em que o Ministério comunicou pela primeira vez tal perspectiva, a Polícia Federal, a partir de denúncias encaminhadas pela Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), realizou a Operação Corsário 2, destinada a fechar 20 rádios que funcionavam sem autorização no município.

Durante a reunião na Câmara Municipal, a representante do Ministério das Comunicações presente, Alexandra Costa, explicou que até hoje cerca de 330 rádios já afirmaram interesse em receber uma concessão para oferecer o serviço de radiodifusão comunitária em São Paulo, num claro sinal de tentativa de regulação de suas partes. O número, contabilizado antes mesmo que um único aviso de habilitação tenha sido publicado no município, no entanto, é muito superior ao total de rádios que devem ser autorizadas pelo Ministério a funcionar na capital. Somada à operação repressiva da PF, a situação reafirma as brutais dificuldades enfrentadas hoje para as rádios garantirem a suas comunidades seu direito à comunicação e o acesso a vários outros direitos e informações de interesse público.

Unidade política

Para que ao menos essa primeira conquista do aviso de habilitação seja possível, “é necessário que todos tenhamos unidade política”, avaliou Sérgio Gomes, do Escritório Paulista da Amarc – Associação Mundial das Rádios Comunitárias e Cidadãs. Dada a demanda maior do que a possibilidade de oferta, ele destaca que será fundamental que as associações e representantes das diferentes comunidades dialoguem entre si para que todos tenham acesso às rádios, em uma situação na qual determinada emissora não estará necessariamente ligada a uma única comunidade.

Além das 330 entidades comunitárias que já demonstraram interesse em colocar uma rádio no ar na capital – e que terão de reiterar esse interesse enviando novos documentos ao Ministério –, os demais interessados também poderão passar a pleitear uma concessão a partir do aviso de habilitação no dia 4. Ou seja, a tendência é que a discrepância entre os interessados e o número de concessões disponíveis seja ainda mais gritante. Na avaliação de Gomes, será importante, a partir dos mapas da cidade, e da localização das associações, “cada um entender onde está o outro, para entender com quem precisará dialogar, com quem precisará se entender”.

Na reunião na Câmara Municipal, as estimativas mais otimistas apontavam que, seguindo a legislação federal para o setor, bem como as características de relevo e de urbanização da capital, poderiam funcionar na cidade cerca de 100 emissoras. Estimativas mais conservadoras apresentadas pelo ministério na reunião – com uma distância maior entre cada rádio autorizada – chegaram a apontar para apenas 36 rádios funcionando. E, caso seja seguida a distância de 4 km entre duas rádios recomendada por estudos encomendados pelo ministério (1 km de raio de alcance, além de 2 km de segurança para evitar maiores interferências), cerca de 75 rádios devem poder operar legalmente.

Os trabalhos iniciados na última semana na Câmara Municipal de São Paulo continuam nesta segunda (27). Na ocasião, as entidades envolvidas buscarão articular parcerias técnicas e jurídicas para auxiliar no processo de habilitação das rádios comunitárias na cidade. Após os debates já realizados entre as entidades e órgãos governamentais, foram estabelecidos alguns critérios que devem nortear o aviso de habilitação como universalidade, eqüidade, representatividade e responsabilidade técnica.

Democratização

Para o deputado estadual Simão Pedro (PT-SP), presidente da Frente Parlamentar em Defesa das Rádios Comunitárias na Assembléia Legislativa de São Paulo, “houve muito pouco avanço no nosso país, e isso também no governo Lula, na questão da democratização das comunicações, especialmente em relação às rádios comunitárias”. O deputado registrou que, no governo Lula, “as rádios enfrentaram um processo de criminalização ainda mais violento” e que “além da criminalização, o Ministério das Comunicações se apresentava sem condições de encaminhar os processos no tempo legal”.

Mas agora parece haver uma percepção de que é preciso avançar no próximo mandato em relação à democratização das comunicações. Segundo Simão Pedro, “a comunicação é um direito humano fundamental, que precisamos ver garantido, especialmente nas comunidades rurais, nas comunidades mais pobres, nas comunidades da periferia das grandes cidades”.

“A diversidade ambiental, cultural, social do Brasil precisa ser refletida nas comunicações”, afirmou Nabil Bonduki, vereador pelo PT entre 2000 e 2004 e diretor da ONG Casa da Cidade. Bonduki participou das atividades na Câmara Municipal e defendeu que cada comunidade tenha mídias específicas em vez de só receber a comunicação massificada e sem sentido para a realidade local. Relator do Plano Diretor do município, ele criticou a divulgação de possíveis números de rádios a serem autorizadas na capital paulista antes de um estudo mais criterioso.

Em seu artigo 266, o Plano Diretor da cidade prevê a elaboração de um Plano Diretor de Radiodifusão Comunitária (PDRC) para, a partir do estudo das características e barreiras físicas do município, determinar a localização e o alcance das rádios. A distância entre uma rádio e outra em uma região de grande adensamento urbano, por exemplo, não tem por que ser necessariamente a mesma em uma região de mananciais, com poucas edificações e, portanto, facilidade maior para as ondas das rádios se propagarem. O Plano Diretor da cidade será revisado em 2007 e, para Bonduki, é importante que a elaboração efetiva do PDRC entre nesta revisão.

Rádio Heliópolis

Em julho deste ano, a Rádio Heliópolis, uma das emissoras comunitárias que melhor cumpria seu papel social em São Paulo, foi fechada pela Polícia Federal na chamada Operação Sintonia – vítima, como todas as demais rádios do município, da não-existência de avisos de habilitação para a capital paulista. No final de outubro, foi publicado no Diário Oficial da União o ato de número 61.629 da Anatel, que cria condições técnicas e legais para que a Heliópolis volte ao ar. No ato, a Agência autoriza a Universidade Metodista de São Paulo a executar em parte da região atendida pela rádio um “serviço especial para fins científicos ou experimentais” de transmissão do sinal de uma emissora de radiodifusão comunitária. O período inicial previsto para o funcionamento da emissora é de seis meses, renováveis.

A parceria entre a universidade e a comunidade foi a solução possível aventada pelos órgãos do governo federal de modo a superar o problema e evitar uma repercussão ainda mais negativa do fechamento da Heliópolis. Mas, apesar da solução para a parte jurídica, o coordenador da emissora, Geronino Barbosa, relatou que agora é necessário levantar os recursos para viabilizar as questões de infra-estrutura da rádio. Para reformar a casa em que a emissora será instalada – especialmente adequar a edificação para a instalação da antena –, bem como comprar os novos equipamentos de edição e transmissão, uma vez que os antigos foram apreendidos pela Polícia Federal, serão necessários cerca de R$ 20 mil.

Fonte: Carta Maior

 
 
 
   
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