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Sepultamento em Santos


Breno Altman*
13.11.2000

Centenas de pessoas acompanharam na manhã do dia 12 de novembro o cortejo fúnebre de David Capistrano. O caixão, envolvido com as bandeiras do Brasil e do Partido dos Trabalhadores, foi trasladado por um carro do Corpo de Bombeiros pelas ruas de Santos. Desde a saída do féretro, na sede da prefeitura, até o Cemitério Memorial, o ex-prefeito foi homenageado com respeito e emoção. A passagem do cortejo era aplaudida. Diante da Secretaria da Saúde, os funcionários alinharam as ambulâncias e fizeram soar as sirenes, em memória de seu antigo chefe. À frente da caminhada seguiam, além dos familiares e amigos mais próximos, o presidente nacional do PT, José Dirceu; o presidente de honra, Lula; o presidente do diretório estadual, Paulo Frateschi; o senador Eduardo Suplicy; os deputados José Genoíno, Telma de Souza, Maria Lúcia Prandi e Mariângela Duarte. O ministro da Saúde, José Serra, também acompanhou o cortejo.

As últimas saudações foram feitas na câmara nobre do cemitério. Os companheiros históricos de David Capistrano foram representados por Max Altman, que lembrou sua trajetória de médico e revolucionário. O ministro José Serra destacou sua contribuição para a organização da saúde pública e recordou sua luta incansável por justiça social. O presidente nacional do PT, José Dirceu, fez as despedidas finais. "É muito difícil ver a bandeira do partido recolhida como está hoje, porque ela está sempre ao vento, como símbolo daqueles que sonham, como você, por um Brasil mais justo", disse Dirceu, com os olhos fixos sobre o caixão. "Mas assim prestamos nossa homenagem, prometendo ir avante na luta pela qual você dedicou sua vida." Após a intervenção do dirigente petista, o corpo baixou para os procedimentos de sepultura ao som da Internacional. Os amigos e companheiros colocaram-se de pé, muitos de punhos erguidos e lágrimas nos olhos.

O ex-prefeito de Santos e dirigente do Partido dos Trabalhadores, David Capistrano da Costa Filho, faleceu às 19h30 do dia 10 de novembro. Estava internado desde o dia 2 de outubro, em São Paulo, no Hospital Sírio Libanês, onde tinha sido submetido a um transplante de fígado. Sua morte foi provocada por septicemia e falência de múltiplos órgãos, depois de trinta dias na Unidade de Terapia Intensiva. A cirurgia foi uma tentativa de superar problema crônico no fígado, com origem no tratamento quimioterápico que enfrentou há quinze anos para combater uma leucemia mielóide aguda.

Pernambucano de Recife, onde nasceu no dia 7 de julho de 1948, casado com Haidê Benetti de Paula e pai de quatro filhos, David iniciou sua participação política ainda na adolescência. Seus pais, Maria Augusta e David Capistrano, eram militantes do Partido Comunista. Depois do golpe militar de 1964, foi preso pelo exército aos quinze anos de idade. Libertado, mudou-se com a família para o Rio de Janeiro, onde cursou a Faculdade de Medicina da UFRJ. O pai, dirigente histórico do PCB, vivia na clandestinidade, perseguido pelas forças de segurança. Combatente da Guerra Civil Espanhola (1936-39) e da Resistência Francesa (1940-45), foi preso em março de 1974, na fronteira com o Uruguai, quando tentava regressar ao Brasil. Está desaparecido desde então.

David começou sua carreira profissional como pediatra, mas logo se dedicou à organização da saúde pública. Fundou diversas publicações e entidades. Um dos mais renomados médicos sanitaristas do país, foi secretário da Saúde em Bauru e Santos. Combinou essa trajetória com uma dedicação intensa à luta contra o regime militar e pela construção de uma alternativa de esquerda no país. Sua participação política obrigou-o a sair do Rio de Janeiro, depois de diversas prisões. Residia no estado de São Paulo desde 1974, onde se transformou no principal dirigente do PCB e responsável pela reorganização da sessão paulista no final dos anos setenta.

Rompeu com seu antigo partido em 1983. Desde 1985 era militante do Partido dos Trabalhadores. Nos anos seguintes foi eleito para sua direção estadual e, depois, para o diretório nacional. Mudou-se para Santos no início dos anos noventa, já como secretário de Saúde do governo petista da prefeita Telma de Souza, a quem sucedeu a partir de 1993. Concluiu seu mandato em 1996 e voltou a trabalhar como médico sanitarista. Coordenou, então, o Qualis/Programa de Saúde da Família. Nos últimos meses atuava como consultor do Ministério da Saúde e da Prefeitura de Vitória da Conquista.

David, além da esposa Haidê, da mãe Maria Augusta e dos filhos Marta, Adélia, David e Augusto, deixa também as irmãs Maria Carolina e Maria Cristina.

Seu corpo foi velado durante quarenta horas, primeiro na Assembléia Legislativa de São Paulo e, depois, na Prefeitura de Santos. No próximo dia 10 de dezembro o Partido dos Trabalhadores realizará, na sede nacional, um ato solene em sua homenagem.


*Jornalista